Ambiente, Energia e Sustentabilidade

As Cidades no Centro da Ação

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As Cidades no Centro da Ação

Autor

Jorge Cristino

Doutorando em Políticas Públicas, Mestre em Relações Internacionais, Pós-graduado em Direito do Ambiente, especializado em Cooperação para o Desenvolvimento e Engenheiro de formação base. Júri do indicador das alterações climáticas do Programa Municípios ECOXXI – Bandeira Verde e membro do Grupo de Missão para o reconhecimento do Clima como Património Comum da Humanidade, junto das Nações Unidas. Atualmente exerce funções como gestor público.

 

O crescimento demográfico global, a concentração da população em áreas urbanas e
o aumento insustentável do consumo têm levado a um aumento da Pegada Ecológica sem precedentes, provocando impactos devastadores no Planeta.

É importante compreender o papel fulcral das Cidades no cumprimento dos Compromissos de Desenvolvimento Sustentável.

Em 2050, estima-se que as Cidades concentrarão 68% da população de todo o mundo. Em Portugal, também em 2050, estima-se que serão perto de 80% dos habitantes a viver em Cidades. Por outro lado, as Cidades que representam 75% do PIB mundial, são também responsáveis por 75% das emissões de gases de efeito de estufa, apesar de apenas ocuparem 3% do território no Planeta.

Acrescentar a isto, é nas áreas urbanas que se atingem os maiores e piores impactos das alterações climáticas e onde existem maiores vulnerabilidades e desigualdades. Por isso, é nas Cidades que se joga o tudo ou nada para alterarmos o rumo dos acontecimentos. É com as Autarquias que se consegue criar uma relação de proximidade com os Cidadãos para se adotarem novos hábitos de vida e de consumo e é com as Autarquias que se consegue estabelecer uma relação de compromisso com os Governos Centrais e as Organizações Internacionais.

Quais os desafios estruturais e estratégicos que enfrentamos?

Apesar de hoje estarmos no caminho certo, ainda são muitos os desafios que enfrentamos. Esses desafios estão identificados, alguns são estruturais e outros são estratégicos. Os estruturais prendem-se com a questão do ordenamento do território, tais como:

• a excessiva impermeabilização e artificialização das áreas urbanas;
• o abandono das áreas florestais;
• a ausência de um bom uso do solo para uma agricultura biológica e de proximidade. 

É urgente valorizarmos o Capital Natural e quantificarmos os serviços de ecossistema. A isto acrescenta-se o facto de termos um modelo económico assente num excesso consumo de recursos e baixa circularidade e a elevada dependência energética dos combustíveis fósseis, mas que, felizmente, se estão a inverter paulatinamente, assim como a nossa diminuição da dependência externa e o combate à pobreza energética dos edifícios. Não tem faltado financiamento para a transição climática, nem tão pouco ambição, como se demonstram nos objetivos para a neutralidade carbónica, a aprovação da Lei do Clima e nas metas para a política energética.

Já ao nível estratégico, o principal desafio urge na nossa ligação ao mar. O oceano representa o futuro e será a nossa janela de oportunidade, não só ao nível económico, mas também ao nível ecológico, sendo necessário conhecer mais e melhor para o saber preservar. Portugal através da participação na construção da Agenda 2030 das Nações Unidas disse presente quando promoveu a defesa, a conservação e a utilização sustentável dos oceanos como prioridade, tendo a Conferência dos Oceanos representado uma excelente oportunidade para reforçarmos esta nossa ligação ao mar e aos recursos marinhos.

As Cidades, os Municípios e a Governança Multinível

Portugal e as Cidades Portuguesas estão a evoluir muito bem e passo a passo estamos a conseguir criar Cidades mais sustentáveis, mais inteligentes e mais resilientes. Prova disso são um conjunto de iniciativas que os Municípios estão a levar a cabo, para que de forma empenhada resolvam problemas conjunturais e outros estruturais e que ajudam a mitigar impactos provocados pelas alterações climáticas, como as secas, as ondas de calor, as cheias e as inundações, assim como outros problemas não visíveis como a qualidade do ar e do solo ou mesmo a poluição dos recursos hídricos. 

Por outro lado, as Cidades Portuguesas estão a conseguir focar-se na urgência da diminuição das emissões de gases com efeito de estufa e a aumentar a captação de carbono através de sumidouros naturais. É um sistema de equações complexo, para o qual é necessária uma visão integrada e multidisciplinar – uma Governança Multinível.

Vários são os projetos que se evidenciam e que trazem inovação e proveito para a Cidade. E felizmente muitas são as boas práticas existentes e por isso a dificuldade é escolher. Começo por aquilo que entendo ser o mais importante numa Cidade: a Governação. Neste particular é extremamente relevante existir uma visão estratégica de longo prazo e uma ação integradora, multidisciplinar, transversal e multinível, com metas e resultados, promovendo a participação ativa da Sociedade e de todas as suas Organizações. Completando o círculo com as Empresas e as Academias, incentivando a comunidade científica a desenvolver projetos de investigação aplicada e sensibilizando a população para uma permanente adoção de hábitos mais sustentáveis, com as Escolas, mas também com os mais idosos, através das IPSS. Esta forma de Governança, suportada por planos estratégicos e planos de ação é fundamental para um território mais inclusivo, sustentável, resiliente e mais inteligente. Esta é a base.

Indicadores ambientais como incentivo para Municípios e Empresas

Apesar de em 2015 já ter sido publicada a Estratégia Cidades Sustentáveis 2020 com as opções orientadoras de desenvolvimento sustentável das Cidades. Ainda assim, mais do que planos e estratégias, e as suas necessárias atualizações, são precisos instrumentos práticos que permitam um desenvolvimento sustentável integrado, isto é, políticas de incentivo e descriminação que não nos faça depender continuamente de financiamentos e apoios externos. 

Para isso, primeiro é necessário estabilizar e universalizar indicadores ambientais que monitorizem a performance das Cidades, à semelhança dos indicadores económicos ou demográficos. Trata-se de medir, monitorizar e avaliar os impactos das medidas implementadas e a otimizar as que venham a implementar. Com isso desenvolver modelos de incentivo aos Municípios e às Empresas, incluindo formas redistributivas de valorização do interior e do seu capital natural, quantificando os serviços de ecossistema, os sumidouros de carbono, as florestas.

Implementar uma cultura de risco e de resiliência

Mas antes de tudo, é necessário alinharmos todos num denominador comum sobre o que é afinal a Sustentabilidade, sem extremismos, nem fundamentalismos. Afinal, é da felicidade coletiva e da Saúde Planetária que estamos a tratar, mas também da sobrevivência da Humanidade e de muitas outras espécies das quais dependemos.

As próximas décadas são extremamente importantes, sendo mesmo os próximos sete anos os mais cruciais, pois após uma pandemia e com uma guerra na Europa e no Médio Oriente, podem tornar as coisas ainda mais difíceis. Urge implementar o conceito máximo de resiliência trazido pelo Primeiro-Ministro Japonês, em 2015, no Quadro de Sendai, o Build Back Better. É cada vez mais importante, termos uma cultura de risco e de resiliência, capaz de, perante cada desafio, ver uma solução e a forma de tornar os nossos territórios mais sustentáveis, mais eficientes e com melhores respostas.

Os prismas da Sustentabilidade Ambiental Urbana

Uma Cidade sustentável e inteligente é aquela que tem as pessoas no centro das prioridades e que se foca na necessidade de criar uma felicidade coletiva e contribuir para uma Saúde Planetária. Como? Pergunta. Como disse anteriormente, sendo uma Cidade verde, uma Cidade resiliente, uma Cidade hipocarbónica, uma Cidade circular, uma Cidade saudável e uma Cidade inclusiva. Estes são os prismas que fazem parte da estrutura conceptual para a Sustentabilidade Ambiental Urbana promovida pela Agência Europeia do Ambiente, sendo um guia para qualquer Município que se preocupe com a Sustentabilidade do seu território e com a felicidade das pessoas. 

Cada vez mais, o Planeta será não só aquilo que os Estados quiserem, mas essencialmente aquilo que as Cidades fizerem e, com isso, o que os Cidadãos queiram ser.

Aristóteles escreveu que “Somos o que fazemos repetidamente. Por isso o mérito não está na ação, mas sim no hábito.”

Lisboa, 5 de abril de 2022 (atualizado em outubro de 2023)

 

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